sexta-feira, 2 de setembro de 2011

A defesa do patrimônio público em perigo!


Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiças de Proteção ao Patrimônio Público e à Ordem Tributária do Estado do Paraná - www.patrimoniopublico.caop.mp.pr.gov.br



Desde a Constituição de 1988 o Ministério Público vem se empenhando no combate à corrupção e na defesa do patrimônio público. Entre pedidos de anulação de atos e contratos administrativos, de ressarcimento de danos causados ao erário e de condenações por atos de improbidade administrativa, muitas ações foram propostas. 
Mas esse avanço está novamente em perigo. Além do risco de retrocesso representado por algumas medidas legislativas e pela Reclamação nº 2138/STF, no último dia 3 de fevereiro, no julgamento do Recurso Extraordinário 225777, o Ministro Eros Grau entendeu que o Ministério Público não tem legitimidade para propor ação civil pública destinada a anular atos ou contratos administrativos e pleitear ressarcimento de danos ao erário. Argumenta que não se tratam de direitos difusos, mas de direitos subjetivos titularizados pela pessoa jurídica de direito público em questão, e, portanto, somente poderiam ser objeto de ação popular.
Com o devido respeito, não se pode concordar com tal entendimento
Ao entender que se trata apenas de direito público subjetivo e disponível, pertencente a pessoa jurídica de direito público interno, o eminente Ministro vislumbrou apenas o interesse público secundário, desconsiderando o interesse público primário existente na questão (clássica distinção feita por Renato Alessi entre interesse público primário e secundário). Porém, vislumbrado sob o prisma do interesse público primário - interesse geral - a defesa do patrimônio público constitui direito difuso. É que, nesta perspectiva, os direitos sobre o patrimônio público não pertencem apenas à pessoa de direito público envolvida, mas a todos que estão sujeitos àquela administração. Então, a proteção do patrimônio público, assim como da probidade administrativa, é direito titularizados por pessoas indeterminadas não unidas por qualquer relação jurídica, a não ser o fato conjuntural de estarem sujeitas àquela administração. É direito indivisível, onde a satisfação de um dos titulares importa, necessariamente, na satisfação de todos, pois não pode existir uma Administração Pública proba para uns e não proba para outros dos indivíduos sujeitos a ela. Assim, fica evidenciado que os pedidos de nulidade de atos administrativos lesivos ao patrimônio público e à probidade administrativa, assim como de recomposição do erário, estão incluídos na proteção do patrimônio público como interesse público primário e direito difuso. 
Ainda que assim não fosse, é a Constituição que considera a proteção do patrimônio público com um interesse difuso. Realmente, pois em seu art. 129, III, estabelece que “são funções institucionais do Ministério Público: ... promover o inquérito civil e a ação civil, para proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos” (destacou-se). Não se pode contrariar a Constituição! 
Ademais, pelo princípio da máxima efetividade, as normas constitucionais devem ser interpretadas de acordo com o sentido que mais eficácia lhes dê, e de acordo com os interesses que visou proteger. Por evidente, o sentido que mais eficácia dá ao programa normativo do art. 129, III, da Carta Magna, é o que considera a proteção do patrimônio público como direito difuso e que confere legitimidade ao Ministério Público para, em defesa do patrimônio público, promover a ação civil pública pleiteando a nulidade de atos administrativos lesivos e a recomposição do erário.
A lei também confere tal legitimidade ao Ministério Público. E, por evidente, essa legitimidade não precisa ser constitucional. Então, ainda que a Carta Magna não a estabelecesse, ela decorreria do art. 25, IV, b, da Lei nº 8.625/93, o qual prescreve que “além das funções previstas nas Constituições Federal e Estadual, na Lei Orgânica e em outras leis, incumbe, ainda, ao Ministério Público... promover o inquérito civil e a ação civil pública, na forma da lei... para a anulação ou declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio público ou à moralidade administrativa do Estado ou de Município, de suas administrações indiretas ou fundacionais ou de entidades privadas de que participem” (destacou-se). Tal norma não é contrariada por nenhum preceito constitucional. Pelo contrário, decorre do art. 129, III, do Texto Maior, além do que está em harmonia com todo o sistema de controle democrático previsto na Constituição de 1988, como admitiu o STJ, chegando a sumular o assunto (Súmula 329 do STJ). 
Irrelevante o argumento de que os pedidos de anulação de ato administrativo e ressarcimento ao erário podem ser objetos da ação popular. Realmente podem. Porém, ser objeto da ação popular não significa ser exclusivo dela. Fosse exclusivo o ente público lesado, enquanto pessoa jurídica de direito público interno, não poderia ajuizar uma ação ordinária anulatória cumulada com ressarcimento de danos, pois tais pedidos somente poderiam ser objeto da ação popular. O fato da ação popular poder ser utilizada em defesa do patrimônio público revela a natureza de direito difuso deste, já que a legitimação para ação popular é concedida a qualquer cidadão para promover a defesa de direito pertencente a toda a coletividade (o povo). 
Logo, não há incompatibilidade entre a ação popular e a ação civil pública. Ao contrário, na defesa do patrimônio público ambas podem ser utilizadas. Em verdade, o ordenamento jurídico institui um micro sistema para defesa do patrimônio público, que pode ser tutelado judicialmente por vários tipos de ação, dentre as quais: ação civil pública proposta pelo ente público lesado, ação popular proposta por qualquer cidadão, ação civil pública proposta pelo Ministério Público, etc.
Destarte, é com perplexidade que se recebe o mencionado voto. O julgamento está interrompido e ainda dez Ministros devem votar. Tem-se a confiança que a situação será revertida. Contudo, há preocupação. Se ficar definido que a Lei de Improbidade Administrativa não se aplica a agentes políticos (Reclamação 2138/STF) e que o Ministério Público não tem legitimidade para promover ações pleiteando a anulação de atos administrativos e ressarcimento de danos ao erário a luta em defesa patrimônio público e o combate à corrupção sofrerão forte golpe.

MÁRIO SÉRGIO DE ALBUQUERQUE SCHIRMER 
Promotor de Justiça 

Improbidade administrativa e a atuação do Ministério Público

CONSTITUIÇÃO FEDERAL DETERMINA AO MINISTÉRIO PÚBLICO A LIGITIMIDADE TENDO A MISSÃO CONSTITUCIONAL
Para que melhor se compreenda o campo de atuação, sua legitimidade e propostas de inovação quanto a todas as questões de extrema importância que se inferem no contexto jurídico nacional, na coibição de atos ímprobos praticados por agentes públicos, é necessária a inferência na instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado denominada Ministério Público.
O artigo 127 da Constituição Federal traz o conceito de Ministério Público. Sua finalidade é a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis. Este mesmo artigo estabelece princípios informadores das funções que o legislador ordinário pode incumbir ao Ministério Público, os quais encontram-se arrolados no § 1º: a unidade, a indivisibilidade e a independência funcional.
O universo de atuação do Ministério Público assume caracteres irrestritos pois o rol de funções institucionais contidos no art. 129 é meramente exemplificativo, o que permite que a lei prescreva, além das previstas constitucionalmente, outras funções ao Ministério Público, desde que compatíveis com sua finalidade (n. IX do art. 129).
Defensor do povo ("ombudsman")
Impõe o art. 129, II, da Constituição ao Ministério Público o zelo pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados na própria Lei Maior, com a obrigação de promover as medidas necessárias à sua garantia.
A função de defensor do povo é de tamanha importância que o Promotor de Justiça Maurício Augusto Gomes assim a conceitua: "a função de defensor do povo é a de defender os interesses da população perante a Administração Pública, porquanto é ela que presta os serviços de relevância pública e tem, primariamente, a obrigação de respeitar os direitos assegurados na Constituição, mesmo porque os direitos assegurados nada mais são do que limites à atuação do poder do Estado." 
A proposta de criação (como Emenda Constitucional) de um órgão inserido nos certames do Ministério Público, com funções bem definidas na atuação efetiva de combate, fiscalização e investigação em todos os processos de improbidade administrativa estará explicitada adiante.
Legitimidade do Ministério Publico
Após estas breves considerações sobre as funções institucionais do Ministério Público e conseqüente descrição de alguns dos principais meios de atuação deste órgão nos casos de improbidade administrativa, é de suma importância que se discorra sobre a legitimidade do representante do Ministério Público para a propositura de ação civil pública e do inquérito civil, visando a condenação dos agentes públicos e terceiros pela prática de atos de improbidade.
Atualmente, a corrente favorável à legitimidade do Ministério Público vem se fundamentando no artigo 129, inciso III da Constituição, assim como nos artigos 16 e 17 da Lei 8.429/92.
A corrente contrária à legitimidade do Ministério Público para o inquérito e a ação civil pública decorrentes de atos de improbidade fundamenta-se nos termos da Lei 8.429 que ao definir o rito para estas ações estabeleceu o procedimento ordinário. Ampara-se também na disposição do inciso IX do artigo 129 da Constituição, porque exercer a defesa do patrimônio público implica exercício da representação judicial das entidades públicas. E ainda porque manteve a Constituição vigente a ação popular como instrumento para a defesa do patrimônio público, sendo parte legítima qualquer cidadão. (Art. 5º, inciso LXXIII).
A jurisprudência do E. Tribunal de Justiça de São Paulo é dominante com o entendimento da legitimidade do Ministério Público e o cabimento da ação civil pública para a defesa do patrimônio público.
Após o reconhecimento desta legitimidade, é mister que se faça entender a necessidade de adequação e organização de um órgão, dentro do próprio Ministério Público, que esteja imbuído com o dever de verdadeiro "ombudsman" junto à população. A proposta de viabilidade deste órgão será feita a seguir.
Tema atual, de importância extrema e que eleva o Ministério Público a um grau de relevância incomparável no Direito Pátrio é o que versa sobre a improbidade administrativa.
A partir de considerações sobre a Lei 8.429,/92 e sobre a própria necessidade de entendimento do enquadramento desta lei no cenário histórico-político nacional, seus aspectos gerais são analisados para que se possa retratar o papel institucional do Ministério Público como órgão de atuação para que esta lei efetivamente se cumpra.
Por todos os meios que a Constituição Federal de 1988 lhe atribui no cumprimento de suas funções, o Ministério Público brasileiro foi impulsionado a uma espécie de "libertação institucional", que se desvincula assim, e cada vez mais, do arcabouço repressivo do Estado para tentar assumir plenamente sua destinação constitucional de agente legítimo para agir em nome dos interesses da sociedade civil organizada.
É justamente através desta libertação institucional que o Ministério Público vê-se imbuído na total necessidade de atuação quando houver qualquer indício de improbidade administrativa.
Esta atuação se efetiva através dos seus órgãos de execução (promotorias e procuradorias de justiça), as quais têm no inquérito civil e na ação civil pública, por excelência, os novos instrumentos processuais para a defesa de direitos difusos e coletivos.
A ação civil pública configura um autêntico instrumento jurídico de defesa dos interesses transindividuais, sobressaindo-se como um inestimável mecanismo de acesso à justiça por parte de amplas camadas da sociedade, em defesa de seus direitos.
Contudo, a atuação do Ministério Público especificamente em situações que ensejam atos de improbidade administrativa, vem sido obstruída por lacunas e imperfeições nas atuais leis que regem a matéria, assim como pela inegável omissão de alguns de seus representantes que se curvam perante as imposições econômicas que servem de respaldo à manutenção da atual desigualdade social que fomenta os mais altos escalões que assumem o Poder Público.
A população não se limita mais a compactuar com a atual situação, tentando sobreviver ao alvedrio de tamanhas crises que são a verdadeira negação de um Estado Democrático de Direito, como o nosso deveria ser e declara nossa Lei Maior.
Com a constatação que a partir do ano 2000 foi recorde na instauração de processos que apuram denúncias de improbidade administrativa envolvendo agentes políticos, servidores públicos e instituições que recebem recursos públicos, torna-se prevalecente o entendimento que urge pela adequação e conseqüente criação de um órgão dentro do próprio Ministério Público, com as adaptações de funcionalidade adequadas ao nosso sistema jurídico, com características próprias, mas inspiradas no que existe de mais efetivo em termos de Direito Comparado, para o combate direto a qualquer tipo de corrupção: a instituição do "Ombudsman".

A lei que versa sobre improbidade administrativa é a Lei 8.429, de 2 de junho de 1992. Seu fundamento é de regulamentação do parágrafo 4º do artigo 37 da Constituição Federal, o qual estatui, in verbis:
"Artigo 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:
§ 4º. Os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível."

A Lei 8.429/92 revogou a Lei 3.164/57 que previa o seqüestro de bens do servidor público adquirido por influência ou abuso de cargo ou função pública e revogou também a Lei 3.502/88 que complementava a Lei 3.164/57, e que tratava sobre os casos de enriquecimento ilícito.
A Lei 8.429/92 surge exatamente inserida num contexto histórico-político de ampla repercussão nacional e para que realmente se efetive, cumpre-se a tarefa de delineá-la quanto aos seus aspectos relevantes e merecedores de atenção. Primeiramente, faz-se mister a conceituação dos termos em questão. O termo improbidade denota "falta de probidade, isto é, de honestidade e de retidão no modo de proceder, particular ou publicamente. Ato de improbidade é todo aquele contrário às normas da moral, à lei e aos bons costumes; aquele que denota falta de honradez e de retidão no modo de proceder." 
Improbidade Administrativa é: "o designativo técnico para a chamada corrupção administrativa, que, sob diversas formas, promove o desvirtuamento da Administração Pública e afronta os princípios nucleares da ordem jurídica (Estado de Direito, Democrático e Republicano) revelando-se pela obtenção de vantagens patrimoniais indevidas às expensas do erário, pelo exercício nocivo das funções e empregos públicos, pelo "tráfico de influência" nas esferas da Administração Pública e pelo favorecimento de poucos em detrimento dos interesses da sociedade, mediante a concessão de obséquios e privilégios ilícitos." 

A Emenda Constitucional nº 45/04 e o princípio da celeridade ou brevidade processual

 

Emenda Constitucional nº 45, promulgada em 08 de dezembro daquele ano, a qual produziu profundas e diversificadas alterações na Carta Constitucional de 1988.
Dentre tais alterações, afigura-se-nos indispensável tecer, desta feita, alguns comentários acerca do inciso LXXVIII do art. 5º da Constituição da República, acrescentado pela referida emenda ao extenso rol dos direitos e garantias fundamentais constitucionalmente assegurados.

"Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
... omissis...
LXXVIII a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação."


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